sábado, 5 de novembro de 2011

O papel da mídia na contenção social




Muita gente já percebeu que agora a periferia é algo que está mostrando as caras na mídia. O que vemos é uma chuva de denuncias contra ruas não calçadas, saneamento básico, praças não conservadas ou caminhão do lixo que não passa nas ruas. O projeto que tenta fazer o povo mostrar sua voz e sua cara na televisão e mostrar os “problemas” pontuais a que passam os bairros, na verdade são uma tentativa de calar a voz dessa população a margem de seus direitos com ganhos pontuais que não mudam sua condição de vida, trazendo uma falsa sensação de participação numa sociedade excludente e que deseja a segregação e apaziguamento das periferias.

O que empresas como a rede globo nordeste vem fazendo, juntamente no seu programa NE/TV é algo que vem sendo feito pela emissora em vários lugares do Brasil. Além de perceberem que as classes c e d dão audiência, uma forma de abocanhar esta fatia considerável dos consumidores de imagens (também em TV digital) é ir lá, no seu bairro, mostrar sua rua não calçada e cobrar do prefeito a “melhoria” de suas vidas.

Claro que todo mundo quer sua rua calçada, coleta regular e um bem estar de vida que possa lhe dar qualidade no seu dia-a-dia, mas a “cobrança” da mídia, na verdade, não passa de uma máscara para dirimir conflitos sociais e ao mesmo tempo servir para a empresa a falsa imagem de  paladina da justiça e verdade perante a população.
 O papel da imprensa é muito forte, uma matéria veiculada numa emissora em um horário nobre é influenciadora de milhares de pessoas. E esse poder não é negligenciado por elas, tanto é que comerciais são mais caros em certos horários. Acontece que, numa busca para ganhar audiência das concorrentes, que no mesmo horário passam programas com níveis de audiência também altos, exemplo de cardinot e Cia, criaram uma forma de o povo sugerir, denunciar e a reportagem ir lá resolver o “problema” de seu bairro.

Qualquer intelectualóide de esquerda (ou os que se dizem) reclamam que o povo é alienado e que não participa da construção da democracia, ou não clamam por seus direitos. Agora, com esta “preocupação” da rede globo em ir ouvi-los e solucionar os infortúnios por que passam, não podemos criticar a forma como a tão sonhada participação do povo na democracia vem se dando.

Esta forma de abordagem e solução esconde uma contenção de demandas. Uma rua não calçada é certamente um tormento, mas com toda a certeza o problema da localidade não é só esse, aparente aos olhos; há problemas estruturais que não são debatidos com a população, trazendo a falsa conformação de que eles apenas precisam de uma rua calçada para serem felizes.

O processo de conscientização já é de todos conhecido, não é mola mestra da mídia, muito menos da rede globo, portanto esta caridade feita é apenas uma ponta de iceberg que tenta dirimir conflitos e trazer uma falsa sensação de paz. Morar na periferia não é ruim se você tem um esgoto bem tratado e o lixo passando na rua, é o que querem mostrar.
Mas eles não tem o intuito de debater e problematizar para os governos e as populações problemas anacrônicos, como demandas sociais por moradia, ou a conscientização do voto, ou a importância de uma organização comunitária para efetivar contendas e problemas que de fato são necessários para a comunidade. Ajeitar uma praça é ótimo, mas trabalhar na educação de jovens e adultos e não só isso na sua conscientização e no oferecimento de condições para que tenham suas vidas melhoradas não é debatido e tão pouco proposto.

A sensação que tenho é que estes programas de televisão tem um acordo com os prefeitos: “só vamos pedir que calcem as ruas, não vamos pedir uma educação de qualidade, fique tranqüilo.” E neste jogo de fantasias a mídia vai ganhando respaldo, a população vai tendo suas necessidades aparentes satisfeitas e as contendas vão sendo dirimidas trazendo uma falsa sensação de que tudo está bem no Brasil e nas periferias, porque lá já calçamos as ruas.